Só quem conhece a alma baiana é capaz de captar o misto de sentimentos na celebração da Lavagem do Bonfim

Amanhece o dia em Salvador. A cidade, colorida por natureza e vocação, se veste inteira de branco. Uma onda de devoção e fé que ruma numa única direção: a Colina Sagrada. É uma quinta-feira especial, a Lavagem do Bonfim. Uma multidão pronta pra pedir e agradecer. Além de fé, é preciso disposição pra subir a colina. A Lavagem do Bonfim, Patrimônio Imaterial do Brasil desde 2013, quando foi reconhecida pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), é o ponto alto do calendário de festas populares de Salvador, que culminam no Carnaval.

A alma da Bahia pode ser vista neste dia. Sagrada e profana, devota e festeira, misturando crenças, agarrada na certeza de que, no alto da basílica, nosso pai Oxalá é o rei, e vem nos valer. E só quem conhece a alma baiana é capaz de captar o misto de sentimentos. Impossível não recorrer ao nosso baú de memórias e encontrar o professor Roberto Albergaria, que melhor do que ninguém traduziu o significado dessa celebração.

“O Senhor do Bonfim não é mais do que o senhor da Boa Morte. É o Nosso Senhor Jesus Cristo no momento em que morre. É a promessa da salvação, de você ter um bom fim, ou seja, ter um bom começo na sobrevida eterna”, disse na Metropole em 2015. Mas o que te leva ao Bonfim pra ver a lavagem das escadarias? A promessa de uma boa morte ou de uma boa vida?

O próprio Albergaria já nos esclarecia que o significado desta festa foi mudando. “As pessoas não acreditam muito em ‘além vida’, elas se preocupam mais com este mundo. Então o Senhor do Bonfim se transformou numa espécie de santo milagreiro, padroeiro, curandeiro”.

Quem nunca foi ao Bonfim levar a chave do carro novo? Quem nunca foi agradecer pelo emprego, pela saúde, por uma graça? Ir ao Bonfim é critério de baianidade. Amarrar uma fitinha no braço ou no gradil da igreja, cada fita uma prece, ao som do hino que mais representa nosso sentimento coletivo de pertencimento a este lugar único, a Bahia.

Hoje é dia de subir a colina. E de lá, daquela altura sagrada, mansão da misericórdia, pedir a graça divina da justiça e da concórdia. Êpa, Baba!

 

Por: Nardele Gomes/ Foto by Nardele Gomes

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