Experiência real mistura mistério, travessuras e a lenda viva do folclore brasileiro

Por Isabela Cardoso

Há quem diga que o Saci Pererê só existe nos livros de Monteiro Lobato ou nas aulas de escola. Mas ele segue por aí, espiando da sombra das árvores, escondendo o que não lhe pertence e rindo do nosso espanto. Negro, pequeno, com uma perna só e a carapuça vermelha que o torna invisível, o Saci é mais do que lenda: faz parte da memória coletiva brasileira.
No Brasil, o dia 22 de agosto é dedicado ao folclore, esse conjunto de saberes e histórias que se espalham como raízes no chão cultural do país. E não há personagem que represente melhor esse imaginário do que o menino levado que surge no redemoinho, pedindo fumo nas estradas, assoprando brasas no escuro e pregando peças em quem ousa duvidar da sua existência.

A travessura que virou lembrança

Thiago Leal, criado na Chapada Diamantina, na Bahia, sabe bem o que é crescer com a presença do Saci rondando o quintal. Sua lembrança começa em uma casa antiga, sede de uma fazenda, onde a avó cozinhava feijão em panela de barro no fogão a lenha. O feijão ficava pronto à noite, mas na hora de servir, tinha sempre um punhado de areia no meio.

Mas as travessuras não se limitavam às panelas. Objetos começaram a se mover sozinhos, quase como se a própria casa tivesse vida própria, e cada canto parecia ganhar um sopro invisível.

“Era cheio de coisa improvável que sumia e aparecia em outro lugar, mas o mais barril dessa casa, era que as coisas pontiagudas (faca, garfo…) voavam e enficavam na porta e parede do nada. Às vezes, a pessoa tava conversando e passava uma faca no meio das duas e fincava na parede, como se alguém arremessasse”, diz.

Imagem ilustrativa da imagem No Dia do Folclore, relato de um baiano vai fazer você acreditar no Saci
| Foto: Reprodução

E entre árvores e frutíferas, o Saci deixava sua marca de forma mais visível. Thiago e o irmão viram com os próprios olhos pelos pés de cajá e caju da fazenda.

“No lugar que essa casa ficava é onde tem as frutíferas principais na fazenda, era onde tinha os pés de cajá na minha infância, tem um pé de cajá que é do lado do de caju. Eu olhava pro pé de caju às vezes e via o ‘menino de pau’, como eu chamava. Meu irmão também já o viu. Era um menino cor de madeira, usava um shortinho vermelho e eu sempre via ele de lado, só via uma perna, como se ele tivesse sentado no galho da árvore igual eu tava, só que eu estava em uma árvore e ele em outra”, destaca.

O riso do vento

O Saci não é mau. É levado. Protege as matas, desarma caçadores, desvia os caminhos de quem insiste em derrubar árvores. Mas com os outros, gosta mesmo é de brincar: puxa o rabo do porco, rouba bolo de fubá, esconde lição de casa e deixa todo mundo desnorteado.

Folclore: a eternidade do invisível

Em 1965, o Brasil oficializou o dia 22 de agosto como Dia do Folclore, lembrando que nossa cultura é feita de cantos, danças, festas e, sobretudo, de histórias contadas à beira do fogo. O termo nasceu em 1846, na Inglaterra, quando o arqueólogo William John Thoms juntou “folk” (povo) e “lore” (saber).

Mas o folclore brasileiro não cabe em definições acadêmicas. Ele vive na panela de barro da avó de Thiago, na tosseira de espinhos onde um bebê foi deixado em segurança por um Saci brincalhão e no vento que rodopia nas estradas pedindo fumo aos viajantes.

 

Por Isabela Cardoso/ Foto by Foto: Joédson Alves | Agência Brasil

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